(Artigo de Tião Soares para Curso de Especialização em Gestão Cultural da Universidade de Girona/Observatório Itaú Cultural, São Paulo, fevereiro de 2010)
Antes mesmo de entrarmos no tema da sustentabilidade da cultura, procuro em primeiro lugar e para início de conversa, a compreensão do é mesmo cultura e para isto, busco apoio em Tylor, a concepção universalista da cultura. É Edward Burnett Tylor(1832-1917), antropólogo britânico, que devemos a primeira definição do conceito etnológico de cultura, a saber:
“Cultura ou civilização, no sentido no sentido etimológico mais lato do termo, é esse todo complexo que compreende o conhecimento, as crenças, a arte, a moral, o direito, os costumes e as outras capacidades ou hábitos adquiridos pelo homem enquanto membro da sociedade”(1871,p.1)
Esta definição simples e clara trazida por tylor, nos faz buscar um outro encontro com Franz Boas (1858-1942) o primeiro antropólogo a conduzir investigação por meio de uma observação direta e prolongada das culturas primitivas. Deste modo, é ele o inventor da etnografia.
Ora, foi também Boas que levava ao extreemo a preocupação com o pormenor e exigia um conhecimento exaustivo da cultura estudada antes de qualquer conclusão geral. Ele aconselhava a prudência, a paciência, passo a passo, na pesquisa. Tinha consciência da complexidade de cada sistema cultural e pensava que só o exame metódico de um sistema cultural poderia dar conta da sua complexidade.
Desse modo, como aqui o assunto é a sustentabilidade da cultura, haverei de buscar, também, a compreensão do conceito de sustentabilidade. O que se ver e se ler em torno deste conceito é o que muita gente diz que sabe o que pensa e pensa que sabe o que é a cultura e, mais que isso, sustentável. Isto é, a sustentabilidade da cultura
Neste terceiro forum e alongando-se por meio da inspiração e das lições tiradas nas aulas presenciais, fomos quase à exaustão em nossas discussões, procurando entender um conceito que acomodasse a compreensão de cada um, neste novo jeito de se achar sustentado, seguros. Ou seja, por assim achar que sustentabilidade é moda, e assim se usa para se definir qualquer coisa que se dar continuidade, que se garanta o ou um futuro, minimamente, equilibrado, etc. Mas, o que é, afinal, sustentabilidade? Um Conceito , um termo não muito novo, criado na década de 80 por representantes de mais de vinte governos, líderes empresariais e representantes da sociedade, membros da Comissão Mundial que discutiam, meio ambiente e Desenvolvimento na Organização das Nações Unidas(ONU).
Nesta busca de compreensão do termo, nos parece mais claro que o desenvolvimento sustentável, caminha para ser aquele que atende às necessidades do presente sem comprometer a possibilidade de as gerações futuras atenderem às suas próprias necessidades. Ou seja, é o equilíbrio na convivência entre o homem e o meio ambiente? Pode ser. Mais o que é mesmo cultura sustentável?
Teixeira Coelho insiste em lembrar que ”a cultura só faz sentido se for expressão da negatividade, Contra esse processo de domesticação da cultura; ou seja, aquilo que traz mudança e destruição”. Desta forma, o conceito de sustentabilidade da cultura pode cair por terra ou mesmo se fragilizar quando se define sustentabilidade como sendo algo que se dar continuidade. Entendo o dizer de Teixeira, acho que a sustentabilidade da cultura ou mesmo a cultura em si, deve sustentar por si só por se transformar, mudar, se destruir; ou seja, ela se sustenta, mas é outra coisa, nunca será a mesma coisa. No entanto é a expressão do novo, é dinâmico.
Entretanto, a idéia do desenvolvimento sustentável não cabe no mesmo conceito da cultura sustentável, no dizer de Coelho, em sua obra “A cultura e seu Contrário”, objeto de estudo de nosso curso.
A relação entre cultura e sustentabilidade, pelo que me parece ser, tem a ver com a sustentabilidade humana, sem esta não acredito que exista àquela. Se o desenvolvimento sustentável é aquele que atende às necessidades do presente sem comprometer a possibilidade de as gerações futuras atenderem às suas próprias necessidades, cabe dizer que a sustentabilidade da cultura somente poderá se entender se houver o equilíbrio do humano com seus valores, crenças, hábitos, suas dinâmicas e portanto, o novo sob as matizes enraizadas, mas não é a mesma coisa.
“Voltando, ainda, a busca de um conceito que nos sustente, recorremos ao dicionário e vemos: Sustentável, adj. que se pode sustentar, capaz de se manter mais ou menos constante, ou estável, por longo período”. (Dicionário Aurélio da Língua Portuguesa).Aqui cabe mais um comentário a respeito do que traz a continuidade e o desenvolvimento das culturas, mas do ponto de vista de uma relação histórica.
Assim a palavra cultura pode ter um segundo sentido além do antropológico. Este segundo é particular, singular, ligado a uma sociedade, a um outro momento histórico. Cada sociedade comporta sua própria cultura, sua própria linguagem, técnicas, valores, mitos, crenças.
Há uma outra compreensão trazida por Teixeira Coelho, em seu dizer ele traz à luz de que a cultura tem que ser reconfigurada. Tudo bem, vamos admitir esse novo olhar. Imaginemos que estamos na origem de nosso debate da sustentabilidade da cultura. Na expectativa de uma perspectiva de acreditar que é assim mesmo: Reconfigurar para sobreviver na/da cultura ou para ela e com ela.
A economia da Cultura, parte de nossa compreensão sustentável
Em nosso último encontro presencial, tivemos a oportunidade de solver belas lições e apreensões com um de nosso mestre, desta feita, Xavier. O mestre para começo de conversa nos traz logo de cara a seguinte questão: O que podemos esperar da economia da cultura? Logo em seguida, mostra as antecipações sobre a economia da cultura e não define muito bem a distinção entre arte e cultura, trouxe, portanto, demonstrações de suas consequências na globalização e da cultura digital, mas isto, no meu entender, apenas do ponto de vista da arte. Desconsiderando, todavia, o conceito mais alargado da cultura.
Com estes questionamentos sobre a economia da cultura ele percorre a idéia da substituição de uma lógica econômica com a lógica artística e, aqui é que faço o meu comentário, de certo modo, discordando do autor por assim achar que a cultura não, apenas, se resume a questão artistica ( conceito de cultura bem definido acima deste artigo e desta forma aqui defendido) e pelo que aparentou ser, vejo na questão cultural um patamar maior e mais sustentável quando se refere a outros modos de vidas e de desenvolvimento social e humano.
Neste sentido, a idéia do artístico tem, nomeadamente, a sua importância, mas a cultura não pode se resumir apenas as belas artes. Por outro lado, vejo que os efeitos econômicos sobre a existência e a sustentabilidade das atividades artísticas devem ser bem significativos do ponto de vista do lucro. Pois, se considerarmos a cultura, apenas, nessa dimensão é mesmo insignificante. Condição bem definida pelo autor, como sendo a arte, a quinta parte da cultura .
Por outro lado, com esta qualificação, o autor considera a cultura, neste ponto de vista, mais alargada e, portanto, mais sustentável por se tratar de uma dimensão humana, junto com a arte e, por isso, acho que é na cultura que se forma a base e ,esta, deverá ser paga por nós povo produtor e consumidor, por assim dizer que pagamos porque somos contribuintes e como tal temos o direito de consumir esses produtos que nós mesmo produzimos, todavia, para esta condição há de se haver por parte do Estado, ressarscimento desta produção,para que deste modo se construa uma política de cultura, sustentando atese acima descrita que a cultura se sustenta por si só porque é humana.
Há de se convir que se considera e nao se conceitua a cultura como sendo uma cultura do espetáculo, nem das belas artes. Neste sentido, a questão do artista terá que ser considerada numa dimensão da cultura. Até porque ele, o artista, está inserido dentro da cultura e com isso tem o seu território e a sua atividade dentro da cultura, desse modo, contribui para o desenvolvimento econômico e social. Assim, sustentável pela condição humana; isto é, dos valores.
Assim, com esta compreensão, a questão não é apenas pela produção. A cultura não pode ser tratada como algo isolado, precisa se ter uma real importncia desta dimensão. Daí, a sustenbilidade da cultura pode se definir por assim dizer, porque é uma necessidade básica de qualquer ser humano. Não há, ao meu ver, possiblidades de se pensar no ser humano sem a cultura e, portanto em sutentabilidade sem esta condição. Daí a questão: a sustentabilidade é humana.
Isso significa cuidar dos aspectos ambientais, sociais e econômicos e buscar alternativas para sustentar a vida na Terra sem prejudicar a qualidade de vida no futuro.
Referências Bibliográficas
COELHO NETO, Jose Teixeira. A Cultura e seu contrário. Ilumnárias, São Paulo, SP. 2009.
COELHO NETO, Jose Teixeira. A cultura pela Cidade, Iluminarias, São Paulo-Sp.2008
CUCHE, Denys. A noção de Cultura nas ciências Sociais, Tradução:Pereira, Miguel Serras.Fim de século.Portugal. 1999.
BOAS Franz, Race, Language and Culture, Macmillan, New York, 1940.
TYLOR Edward B., La Civilization Primitive (trad. Franc.), Reinwald. Paris, 1876-1878, 2 vol.
Idealizada por Tião Soares, metodologia inovadora, a auscultação social consiste em realizar, antes, durante e depois das atividades, diálogos permanentes com educadores, educandos, gestores e comunidade levando-se em conta o “fazer com”, fazer junto, em contraposição ao “fazer para”.
quarta-feira, 10 de fevereiro de 2010
sexta-feira, 29 de janeiro de 2010
Auscultação Social: Um Olhar sobre a Cultura como Política e suas Práticas no interior de Projetos Sociais
(parte do folheto de Trabalho apresentado no Fórum Social Mundial 2009 em Belém do Pará)
Não devemos reinventar a roda, mas fazê-la rodar. Muitas atividades já foram desenvolvidas nas comunidades e cabe a nós enxergá-las com outros olhos. É necessário valorizar e aproveitar, ao máximo, as experiências já vivenciadas pelos atores sociais e fazer valer a prática da educação compartilhada e a troca de conhecimentos.
As ferramentas da auscultação social estabelecem em si um jeito de escutar e de observar os gestos, os ruídos internos e o que há dentro de cada um, escutar o barulho do silêncio e o que o gesto comunica. Valorizar o saber social da comunidade, observar seus modos de vida, conhecer raízes de seu acervo cultural, a origem e história dos moradores, resgatar a memória coletiva são caminhos para despertar um sentimento de pertencimento. É desta forma que a metodologia da ausculta social propõe a pensar a cultura como uma política pública. A cultura da raiz, da origem da historia que as pessoas vivem em suas comunidades. O sentido do jeito e o jeito de ser de cada um e de cada comunidade.
Na prática, diálogos permanentes e contextualizados com educadores, educandos, gestores e comunidade, privilegiando o “fazer com”, fazer junto com a comunidade, em contraposição ao “fazer para”, nos mostra que é através da cultura que afrontamos o destino com que nos deparamos. É através da cultura renovada e de uma educação renovada que seremos capazes de responder aos desafios da era planetária e remediar as carências mais fundamentais de nossas culturas.
Assim as atividades educativas, culturais, artística e de cidadania tem caráter formativo e são trabalhadas em círculos culturais, ou seja, valendo-se do método, que é a nosso ver, inovador, mas bastante simples: A auscultação Social.
Apesar do Desencantamento do Mundo moderno, por meio da ausculta social, lições são aprendidas e tiradas no caminho trilhado, proporcionando a ampliação do desenvolvimento humano em outras comunidades, dando-lhe um caráter de articulação da arte, da cultura e da cidadania.
Cultura e Educação: Pares para a Sustentabilidade Humana
(resenha de folheto do Trabalho apresentado no Fórum Social Mundial 2009 em Belém do Pará)
Pensar a cultura e a educação como pares para a sustentabilidade humana, é pensar em ações que se constituam em ponto de partida, em instrumento para um debate que culmine em uma perspectiva da problemática educativa, cultural e de valores humanos.
Culturalizar a educação é arte que se constrói fazendo fruir práticas e manifestações na sua localidade. Da conversa em pé-de-calçada e da roda de conversa, o saber e o viver de cada um é fator importante no processo de aprendizagem.
As piscadelas de um olhar têm sentidos diferentes porque a cultura se manifesta através das culturas, como a linguagem humana só pode se manifestar através das diversas linguagens. De modo, que a idéia da sustentabilidade é nomeadamente humana e para tanto ela se fundamenta por meio desses pares: Cultura e educação.
Como conceber um projeto possível de desenvolver o potencial criativo de pessoas e pensar na possibilidade que este seja construído por elas, considerando que a cultura é um complexo conjunto de hábitos, costumes, práticas, normas, proibições, estratégias, idéias, transmitidos de geração, que se reproduzem e se mantém, produzindo a complexidade humana?
A união da cultura com a educação possibilita abrir janelas críticas e conscientes, para que as pessoas se tornem capazes de refletir sobre os seus fazeres e saberes. Saberes deixados para trás e ou adormecidos, devido ao grande fluxo de informações, vez transformados em deformações.
A metodologia da auscultação social usada em projetos sociais que se desenvolvem em alguns espaços comunitários e governamentais – sociedades de bairro, casas de cultura, oficinas culturais, Ongs, etc – despertam o entendimento do fazer saber, da compreensão do ser como produtor de sua própria cultura.
Assim a palavra cultura pode ter um segundo sentido além do antropológico. Este segundo é particular, singular, ligado a uma sociedade, a um outro momento histórico. Cada sociedade comporta sua própria cultura, sua própria linguagem, técnicas, valores, mitos, crenças.
Pensar a cultura e a educação como pares para a sustentabilidade humana, é pensar em ações que se constituam em ponto de partida, em instrumento para um debate que culmine em uma perspectiva da problemática educativa, cultural e de valores humanos.
Culturalizar a educação é arte que se constrói fazendo fruir práticas e manifestações na sua localidade. Da conversa em pé-de-calçada e da roda de conversa, o saber e o viver de cada um é fator importante no processo de aprendizagem.
As piscadelas de um olhar têm sentidos diferentes porque a cultura se manifesta através das culturas, como a linguagem humana só pode se manifestar através das diversas linguagens. De modo, que a idéia da sustentabilidade é nomeadamente humana e para tanto ela se fundamenta por meio desses pares: Cultura e educação.
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